Dom Bernardo Bonowitz 1949 – 2025

Dom Bernardo Bonowitz, com especial carisma, marcou indelevelmente a vida de muitas pessoas que com ele entraram em contato.
Digno de nota é o fato de que como filho primogênito de uma família judaica seria improvável a sua conversão ao Cristianismo. É sabido que, em geral, judeus convertidos costumam levar muito mais a sério os ensinamentos cristãos, do que os nascidos na religião cristã. Assim, também, se deu com Dom Bernardo que neles mergulhou com sua consciência profundamente mística.

A exemplo do também trapista Thomas Merton, ele se tornou um monge sui generis, que combinava a santidade de uma vida interiorizada na Trapa, e totalmente devotada, com a aguda articulação de um comunicador de escol. Com sua mente brilhante ele conseguia transmitir profundas verdades com linguajar simples, metáforas e citações pinçadas de sua vasta cultura.

Em seu livro “Saint Bernard’s Three-Course Banquet”, por exemplo, Bonowitz cita o primeiro canto da Divina Comédia, o canto introdutório, onde Dante, perdido, diz: “a meio caminho de nossa vida me encontrei na escuridão de uma selva”; e vislumbra à distância uma cruz no alto de uma colina, sem divisar qualquer caminho que leve a ela. É quando Virgílio vem em seu auxílio para lhe dizer que o caminho para o alto, e de saída da selva, é para baixo!

Ele faz essa citação para lembrar que a Regra de São Bento também reza que é apenas descendo ao interior de si mesmo que se pode sair da selva. Isso porque os nove círculos do inferno que Dante atravessará acompanhado por Virgílio, que é um símbolo da razão, não são apenas cósmicos, mas também são microcósmicos, e Dom Bernardo segue afirmando:
“Há muito mistério: para ir além de si mesmo você deve permanecer em seu interior. Não apenas o caminho para o alto é o de descer, mas a via de saída está aí dentro. Se você quer entrar em comunhão com outros deve, se dirigir ao verdadeiro centro de si mesmo. É ali que está a porta que leva para fora.”

Lembro de ter tido o privilégio de organizar três retiros para a Comunidade Mundial para a Meditação Cristã com Dom Bernardo como palestrante: um em fevereiro de 2015 na Vila Kostka em Indaiatuba, outro em julho de 2016 na Casa Siloé em Vinhedo e o último em julho de 2017 na mesma Casa Siloé.

Suas palestras eram riquíssimas e enriquecedoras, sempre entremeadas com um fertilizante bom humor. Lembro, por exemplo de uma história da vida dele que contou em uma dessas palestras, de quando ainda era noviço. Disse que em uma de suas confissões havia confidenciado ao mestre de noviços, um monge experiente, e também com bom humor, que uma de suas paixões não realizadas eram as motocicletas. Depois disso toda vez que eles se encontravam no claustro caminhando lentamente em contra-corrente, aquele mestre sussurrava bem baixinho “vrrruuuummm”, … e todos os participantes do retiro caíram na gargalhada. Pra quê… Cinzia, minha esposa, que não é de se fazer de rogada, na primeira oportunidade puxou de lado nosso amigo José Francisco Daniel que, de Campinas, chegara ao retiro com sua potente motocicleta para lhe sugerir que ao final do retiro levasse Dom Bernardo para dar uma volta, que este com muita humildade, generosidade e alegria aceitou de bom grado. Imagine-se a cena: um monge trapista em seu hábito, na garupa de uma motocicleta, sem capacete protetor, dando uma volta pelas vias de Vinhedo. Foi uma celebração.

Creio que seja assim que Dom Bernardo Bonowitz, o inspirado e inspirador monge trapista, autor de numerosos livros que são verdadeiros faróis do caminho do misticismo cristão, gostaria de ser lembrado: com um largo sorriso de alegria de viver.

 


Roldano Giuntoli é membro da Comunidade Mundial para Meditação Cristã e foi coordenador nacional; é engenheiro naval aposentado, professor de Yoga e autor do livro Misticismo Cristão & Yoga. Contato: roldano.giuntoli@hotmail.com

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