Carta 15 – O Labirinto de Chartres
Cara(o) Amiga(o)
Quando alguém entra na grande Catedral de Chartres (construída na França do séc. XIII) pela porta oeste, encontra-se pisando e caminhando pelo Labirinto do Peregrino. O Labirinto é desenhado por pedras pretas no piso da nave da Catedral, abaixo dos vitrais da Rosácea, cujo diâmetro ele reflete com exatidão. Durante a idade média, peregrinos pobres que não podiam ir a Jerusalém, faziam uma “peregrinação” simbólica, de joelhos, ao longo de todas as curvas e voltas do labirinto, na própria catedral. Em Chartres, como em muitas outras catedrais europeias, onde desenhos similares também existiam, esta mandala espiritual adquiriu grande significado na devoção dos leigos. Muitas gerações experimentaram a alegria de chegar ao centro do labirinto após muitas dúvidas e hesitações.
Se você seguir o diagrama do labirinto com seu dedo você começará a entender porque John Main não considerava a meditação simplesmente como um método de oração, mas como uma peregrinação e um meio de vida. Assim como a meditação, realizar com devoção a peregrinação do labirinto ilumina a jornada de nossa vida. Todas as curvas e voltas do labirinto nos ajudam a colocar nossos momentos de acídia e de apatéia, de turbulência e de paz, na perspectiva da concepção global da jornada.
Começamos pelo princípio. Todo percurso humano, mesmo aquele espiritual que transcenda o tempo e o espaço, tem um princípio definido. Não estamos longe do centro, mesmo no princípio, mas temos um percurso a realizar, um processo de compreensão e de autodescoberta, antes de percebermos estar, de fato, já e sempre, no centro. No princípio, parece que chegaremos ao centro num percurso em linha reta, mas logo encontramos os padrões recorrentes de voltas e curvas que testam e aprofundam a nossa fé. Eles podem nos fazer acreditar que estamos perdendo terreno, voltando atrás, e depois de anos de meditação pode nos parecer que não fizemos progresso, exceto pelo amadurecimento de nossa fé, que é o significado essencial de nosso crescimento espiritual. Esta mesma fé então nos mostra que as curvas e reviravoltas do caminho não são a forma como um Deus difícil torna a vida mais difícil, mas a maneira com que um mestre compassivo e sábio desata os nós de nosso coração.
O labirinto nos mostra a sabedoria de não tentar medir nosso progresso: precisamente porque a jornada não é linear e mental, mas cíclica e espiritual, como as espirais de uma mola. Tudo que importa é a confiança de sabermos estar a caminho. O caminho para o centro é estreito, mas leva à fonte da vida. A vida é eterna nessa origem. Precisamos apenas permanecer no caminho. Se tentarmos trapacear e pular do lugar onde estamos para onde queremos estar, sem passar pelo caminho que devemos seguir, ficamos perdidos e confusos. Mas, de qualquer ponto, podemos recomeçar. A compaixão de Deus, sempre presente, é mais diretamente vivenciada na constância da caminhada e na descoberta última, no centro, do significado da jornada que fizemos. Temos apenas que seguir adiante na fé. Quem busca, encontra.
A meditação é um caminho. Ela é, antes de tudo, um caminho de experiência, e não de pensamento ou imaginação. Até mesmo um símbolo como o labirinto indica isso. Um símbolo como o Labirinto do Peregrino de Chartres, ainda que rico em significado, só é verdadeiramente entendido quando vemos que ele aponta para além dele mesmo, completamente além do mundo dos signos. Olhar para uma ilustração do labirinto e traçar a rota até o centro com o dedo é muito diferente de fazê-lo na realidade, de joelhos. Quão diferente é então a prática diária da meditação da mera leitura ou conversação sobre ela.
Laurence Freeman OSB
“Christian Meditation Newsletter”, março de 1992
Até a Próxima Semana
Escola da Comunidade Mundial para a Meditação Cristã
BRASIL