A condição humana essencial
Por Kim Nataraja
O estado de estar na Presença de Deus, no Reino, é uma capacidade humana inata. Todos podem passar pela porta estreita da atenção e da fé – fé no elo essencial que existe entre a humanidade e a Realidade Divina.
Os primeiros Padres da Igreja não tinham sombra de dúvida de que a união com o Divino é possível para todos, independentemente de quem você pensa que é: “Deus é a vida de todos os seres livres.
Ele é a salvação de todos, dos crentes e dos incrédulos, dos justos ou dos injustos, dos piedosos ou dos ímpios, dos libertos das paixões ou dos apanhados nelas, dos monges ou dos que vivem no mundo, dos educados e dos analfabetos, dos saudáveis e dos doentes, dos jovens e dos velhos.
Ele é como o derramamento de luz, o vislumbre do sol ou as mudanças do tempo que são iguais para todos.” (Gregório de Nissa).
A razão para isso pode ser encontrada em sua teologia. Os filósofos gregos, em particular Platão, foram os primeiros a formular a ideia de termos algo essencial em comum com o Divino. Eles a chamaram de ‘nous’, inteligência intuitiva pura, distinta da inteligência racional.
Ter algo parecido com o Divino dentro de nós, nos permite conhecer o Divino, já que a ideia predominante do pensamento inicial era que, somente “semelhante pode conhecer semelhante”.
Nossa experiência cotidiana também confirma isso. Sabemos que para que a comunhão entre os indivíduos seja possível é preciso que haja semelhança. Somente quando temos algo substancial em comum com outra pessoa podemos realmente nos relacionar com ela, podemos ser um em mente e alma.
O Padre da Igreja primitiva Clemente de Alexandria, viu a correspondência entre o conceito de ‘ nous ‘ e aquele expresso no Gênesis, de ser criado à ‘imagem de Deus’. Seguindo-o, Orígenes, os Padres Capadócios, Evagrio e ainda mais tarde Mestre Eckhart, todos viram esta “imagem de Deus” como eterna e originalmente una com Deus.
Para entrar neste nível superior de realidade precisamos da oração contemplativa, à qual a meditação conduz. “Pode ser verdade que o princípio Divino esteja presente em cada ser, mas nem todo ser está presente nele. Nós mesmos iremos morar com ele se o invocarmos com orações muito santas e uma mente tranquila.” (Dionísio, o Areopagita)
Todos sabemos que a jornada para o silêncio não é fácil, mas não estamos sozinhos nesta aventura, como salienta Evágrio, o Padre do Deserto do século IV: “O Espírito Santo tem compaixão das nossas fraquezas e, embora estejamos impuros, muitas vezes vem nos visitar. Se ele encontrar nosso espírito orando a ele por amor à verdade, então ele desce sobre ele e dissipa todo o exército de pensamentos e raciocínios que o cercam.”
Tudo o que precisamos fazer é perseverar. Ao fazê-lo, Cristo, o espírito que dá vida, nos ajudará a acessar “o maior poder da consciência humana… sua capacidade de transcender suas operações mentais, de ir além de seus maiores pensamentos, e assim ser espírito.” (Laurence Freeman) O resultado disso é, como disse Evagrius. “Se você orar com toda a verdade, você encontrará um profundo sentimento de confiança, então os anjos caminharão com você e o esclarecerão sobre o significado das coisas criadas.
06 de janeiro de 2024