São Paulo

Por Kim Nataraj

O ensinamento de Jesus, São João e Meister Eckhart traz à tona a importância de reconhecer os dois lados da nossa natureza humana.

O ensinamento de Jesus, São João e Meister Eckhart traz à tona a importância de reconhecer os dois lados de nossa natureza humana. Quando percebemos que somos Marta e Maria, que além do “ego” ativo, está nosso ser espiritual, é visto por Meister Eckhart como o “Nascimento de Cristo na Alma”. Nosso trabalho de meditação/contemplação facilita essa percepção e possibilita a necessária integração desses dois lados do nosso ser. Não deixamos de “fazer”. O “ego” precisa fazer o que somos chamados a fazer, mas nosso verdadeiro “ser” espiritual infunde nosso “fazer”. São João apresenta Jesus como exemplo da perfeita integração do humano e do Divino.

 Essa súbita consciência da parte mais profunda e importante do nosso ser, foi chamada pelos primeiros cristãos de “Metanoia”, uma mudança total de perspectiva da realidade. O momento de São Paulo foi dramático, como todos sabemos, mas como explica Laurence Freeman:

 …. No capítulo 12 da segunda Carta aos Coríntios, Paulo refere-se a uma experiência de ser ‘arrebatado ao paraíso’ (‘seja no corpo ou fora do corpo, não sei – Deus sabe’) em que ouviu ‘palavras tão secretas que os lábios humanos não podem repeti-las’. Tem semelhanças na expressão com o misticismo apocalíptico judaico, mas é único também, especialmente por ser tão claramente autobiográfico. O significado de seu relato disso, no entanto, não é “vangloriar-se”, o que ele diz não fazer bem, mas insistir que as pessoas formem uma estimativa dele com base no que veem, ou seja, sua fraqueza humana. Como é ele, esse apóstolo individual que recebeu uma graça mística tão grande? Surpreendentemente, mas significativamente, assim como nós. Ele continua dizendo que lhe foi dado um “espinho na carne” para mantê-lo humilde, uma aflição que, apesar de suas orações, Deus não levantou dele. Assim, ele foi mantido fraco e humilde, enquanto era capacitado com uma grande graça orientadora para cumprir sua missão.

E é a fraqueza, não as experiências místicas de que ele se orgulha, porque o “poder de Cristo” repousa sobre os fracos, e o poder divino só é visto plenamente na fraqueza humana. ‘Porque quando estou fraco, então eu sou forte’. (2 Cor 12,10) Aqui vemos a renúncia essencial ao poder que está no centro do mistério de Cristo e da vida centrada em Cristo. O misticismo cristão, não se concentra apenas na experiência subjetiva, que pode tão facilmente insuflar o ego, mas ainda mais na obra de Deus, no contexto maior do mundo e no serviço aos outros. Assim, Juliana de Norwich está em uma grande tradição quando ela entendeu suas ‘revelações de amor divino’ como sendo dadas a ela para o benefício dos outros.”

Paulo nunca perdeu o lado humano, o lado “Marta” de sua natureza, mas foi o lado humano iluminado pela parte mais profunda e espiritual de seu ser que infundiu tudo o que fez. “Já não sou quem vive, mas Cristo vive em mim“. Essa percepção deu-lhe força e perseverança para guiar os outros e apontar para o “além” do nosso ser, e da Realidade como um todo.

8 março 2024                                                                                                                      

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