Quaresma 2024

Sexta-Feira após a Quarta-Feira de Cinzas

Por Laurence Freeman OSB

Deus uma vez deu uma simples escolha para a confusão de pessoas, que ainda não formavam uma tribo, e estavam caminhando pelo deserto, se rebelando em um dia, e arrependendo-se em outro: vida ou morte. Isso os assustou e os concentrou (por um instante). Em nosso tempo a escolha é feita em termos menos religiosos: tédio ou admiração. 

Nosso desejo por novidades e estímulos se estende a todo aspecto de nossa vida diária. Nós não podemos processar tudo isso dentro de nós e tentar fazê-lo é nauseante. Ganância, para os padres do deserto, era a fantasia de poder possuir e controlar tudo, o que é evidentemente impossível. Mas fantasias impossíveis frequentemente controlam nosso comportamento. Gula é diferente de ganância. Na tradição do deserto, era a tentativa absurda de colocar tudo o que fantasiamos possuir dentro do nosso ego, consumismo até o ponto de regurgitar ou prejudicar nosso bonito planeta. Isso também muda a forma como pensamos. 

Nós medimos significado e valores por meio de análises econômicas e, cada vez mais, o que não é reduzido ao pensamento quantitativo? Existe um programa de computador para quase tudo que é essencialmente humano, até mesmo para compaixão e terapia. Quantificar o humano desumaniza e enrijece nossas mentes e corrompe nossa visão de mundo. Marco Schorlemmer, um renomado pesquisador de Inteligência Artificial (IA) em nossa comunidade, me disse recentemente que é a linguagem que usamos sobre IA que causa nosso temor e ansiedade sobre o tema. Computadores não aprendem. Eles não tem memória. Eles não escolhem. IA não é inteligente. Eles só fazem o que os programamos para fazer.   

Se fizermos deles nossos novos ídolos e transferirmos nosso poder interno para eles, estamos meramente repetindo a idolatria que foi ridicularizada pelo salmista (Sl 115): 

⁴ Os ídolos deles, de prata e ouro, são feitos por mãos humanas.
⁵ Têm boca, mas não podem falar, olhos, mas não podem ver.

O perigo não está no ídolo mas em nossa propensão a nos subordinar, a ver a consciência humana e o bem estar como inferiores ou irrelevantes. Durante os seus anos de caminhada pelo deserto, aqueles que escaparam da escravidão frequentemente ficavam deprimidos e entediados e construíam ídolos que os confortassem. A idolatria eventualmente falha e nos mata de tédio. A escolha pela vida geralmente não é confortável, mas nunca é entediante. 

A meditação é praticada no espírito da Quaresma durante o ano. Nestes dias, podemos entender o motivo. Meditar é uma escolha e faz a escolha pela vida. Nem sempre fácil, confortável e conveniente. É repetitiva, mas nunca entediante.


Texto original

Friday after Ash Wednesday

God once gave the mishmash of people, hardly yet even a tribe, who were trekking through the desert, rebelling today, repenting tomorrow, a simple choice: life or death. It scared and focused them (for a while). In our day the choice is in less religious terms: boredom or wonder.

Our craving for novelty and fresh stimulation extends into every aspect of daily life. We can’t possibly cram everything in and to try is nauseating. Greed, for the desert teachers was the power-fantasy of possessing and controlling everything, which is evidently impossible. But impossible fantasies often control our behaviour, Gluttony is different from greed. In the desert tradition it was the absurd attempt to stuff everything we fantasised about having into our ego, over-consumption to the point of throwing up or harming our beautiful planet. It also changes the way we think.

We measure meaning and values by economic analysis and, increasingly, what is not reduced to quantitative thinking? There’s a computer programme for nearly everything essentially human, even for compassion and therapy. Quantifying the human dehumanises and coarsens of our minds and corrupts our vision of the world. Marco Schloremmer, a renowned AI researcher in our community, told me recently that it is the language we use about AI that causes our dread and anxiety about it. Computers don’t learn. They don’t have memory. They don’t choose. AI is not intelligent. They just do what we program them to do.

If we make them our new idols and transfer our inner power to them we are merely repeating the idolatry ridiculed by the psalmist (Ps 115):

Their idols are silver and gold, made by human hands.
They have mouths, but cannot speak, eyes, but cannot see.

The danger is not in the idol but in our willingness to subordinate ourselves, to see human consciousness and well-being as inferior or irrelevant. In their years of wandering, those who escaped slavery often got depressed and bored and made idols to comfort themselves. Idolatry fails and eventually bores us to death. The choice for life is usually not comfortable but it is never boring.

Meditation is practiced in the spirit of Lent throughout the year. In these days we can understand why. Meditating is a choice and makes the choice for life. Not always easy, comfortable or convenient. It is repetitious, but never boring.

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