carta 26 – A Meditação é realmente parte da tradição Cristã?

Recentemente, uma das questões que me apareceu no website foi de uma pessoa que estava atraída pela meditação e pelos ensinamentos de John Main e Lawrence Freeman. Ele sabia que John Main encontrou essa forma de oração nos escritos de São João Cassiano no Século IV, que assimilou que os eremitas do deserto meditavam. Mas ele não pôde encontrar nenhuma evidência para essa forma de oração nas Sagradas Escrituras que ele amou e estudou por muitos anos.

Ele está correto no que se refere a não existir uma passagem que afirma claramente que a meditação praticada no deserto fosse também uma forma de oração que os discípulos usavam. Mas os Padres e Madres do Deserto que iam para o deserto – como Jesus tinha feito – buscando silêncio e solidão, basearam suas maneiras de viver e rezar no Seu exemplo e ensinamento. A Tradição e não o individualismo era um aspecto importante da vida naqueles primeiros séculos.

Todos os ensinamentos básicos da oração contemplativa, à qual a meditação nos leva, nós os encontramos nas Sagradas Escrituras: solidão, silêncio, quietude, estado de alerta, repetição de uma oração ou uma frase-oração com fiel atenção cuidadosa, assim, deixando todos os outros pensamentos para trás e permanecendo no momento presente, conduzindo à interioridade e ao senso de união. (Veja páginas 202-204 “Jesus, o Mestre Interior”)

Nós encontramos isso também no sucinto conselho de John Main: “Sente-se, sente-se quieto e ereto. Feche seus olhos levemente. Sente-se relaxado, porém alerta. Silenciosamente, e interiormente, comece a dizer uma única palavra. John Main recomendava a palavra-oração Maranatha. Ouça-a quando você a diz, suavemente, mas continuamente. Não pense ou imagine nada espiritual, por outro lado. Se os pensamentos e as imagens surgirem, estes são distrações na hora da meditação, então continue retornando a simplesmente dizer a palavra. Medite vinte ou trinta minutos a cada manhã e noite.”

Quando Jesus foi perguntado pelos discípulos como eles deveriam rezar, Ele ensinou a eles o que nós chamamos de “Pai Nosso”. No Aramaico original, que era a língua comum no Oriente Médio no tempo de Jesus, como Laurence Freeman nos traz, “esta oração é uma coleção de frases curtas e rítmicas. As frases teriam sido memorizadas e repetidas frequentemente e interiormente. (p. 201)

A versão que temos agora é uma tradução do Aramaico falado para o Grego, depois para o Latim e finalmente para o Inglês. Esta série de traduções causou a perda do ritmo e da riqueza de significado do Aramaico original. Mas, no entanto, a recitação desta oração com total atenção é muito eficaz.

“Rezar o Pai Nosso requer mais do que a repetição mecânica ou o canto das palavras. Requer atenção plena… requer atenção por meio de uma repetição fiel que leva à quietude e ao entendimento.” (p.202) A atenção é a qualidade mais importante da oração: “o ambiente em que Jesus ensinou esta fórmula… enfatiza a atenção como a qualidade primária de toda oração”.

Laurence Freeman enfatiza que no Capítulo 6 do Evangelho de Mateus “O ensino de Jesus descreve os elementos essenciais da meditação. Em primeiro lugar, Ele enfatiza como a oração deve estar enraizada na sinceridade do verdadeiro Eu e não na consciência do ego: “Cuidado para não fazer uma exibição de sua religião diante dos homens; se você fizer isso, nenhuma recompensa espera por você na casa do Pai no céu. ‘…. [depois Ele] recomenda a solidão e a interioridade, a intimidade silenciosa e o mistério oculto da oração: ‘Quando você orar, vá para um quarto sozinho, feche a porta e ore ao Pai que está lá no lugar secreto; e teu Pai, que vê o que é secreto, te recompensará.” (p.202)

Esse ditado sempre me intrigou, pois sabia que um quarto próprio era algo que só os muito ricos tinham no tempo de Jesus. Mas então li a explicação de São João Cassiano: “Oramos em nosso quarto quando retiramos nossos corações completamente do barulho de todos os pensamentos e preocupações e divulgamos nossas orações ao Senhor em segredo, por assim dizer intimamente. Rezamos com a porta fechada quando, de lábios fechados e em silêncio total, rezamos ao Senhor não com nossas vozes, mas com os corações e, tudo faz sentido, como descrição da meditação, a oração contemplativa.

Quando repetimos a Oração do Senhor, usamos muitas palavras e, no entanto, é eficaz. Em outro lugar, Jesus enfatiza a economia verbal na oração: “Não devemos ficar ‘balbuciando’ como os pagãos que pensam que quanto mais dizem, mais provável é que sejam ouvidos.” (Mt 6, 7-8)

Sabemos por São João Cassiano que os Eremitas do deserto seguiram esse conselho e usaram uma frase das Escrituras como foco, que ele chamou de ‘fórmula’. John Main simplificou isso ainda mais quando e escolheu ‘Maranatha’, como nossa palavra de oração – é uma das primeiras palavra-oração cristãs e, não leva ao pensamento por associação.

Mas mais importante do que todas as palavras sobre a oração contemplativa é o compromisso real com a prática e a transformação que se segue: “Se a oração… não muda quem reza… está faltando algo essencial”. (pág. 205)

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