Carta 3 – Uma Pergunta e sua Resposta
Cara(o) Amiga(o)
Bob é um amigo e meditante fiel que se vale do ensinamento semanal em seu grupo de meditação e, em vista do ensinamento da semana passada “Basicamente pecadores ou essencialmente bons”, ele me fez a seguinte pergunta: “receio que o ensinamento dessa semana aparente ser algo herético. Acho que esse ensinamento me causou certa confusão. Você parece citar John Main quando disse que os pecados que cometemos não têm importância e não podem existir. Como é que algo pode não ter importância e, ao mesmo tempo, não existir? E, também, se for assim, qual a razão do Sacramento da Reconciliação? Por que é que Jesus nos disse para confessarmos nossos pecados uns aos outros se eles não têm importância, ou não existem?”
Bob pode muito bem ter manifestado uma incerteza da mente de outros companheiros da meditação. Por isso, e por ser essa uma pergunta de grande importância, pedi para que Laurence Freeman a respondesse e sua explicação é a seguinte:
“O pecado é uma questão profunda. Juliana de Norwich diz que ela via os seus efeitos em toda parte no mundo, mas não podia ver o pecado que os causara. Isto é porque se trata de uma negação da verdade, da realidade e do amor. Os negativos são difíceis de se ver. Tal como John Main costumava repetir, o pecado é uma ilusão. O significado literal para o termo que o Novo Testamento usa para o pecado é o de ‘errar o alvo’.
Uma teologia e uma compreensão contemplativa do pecado se concentra nesses aspectos, em vez de se concentrar no aspecto legalista. Os legalistas enfatizariam o pecado meramente como uma infração a uma regra. São Paulo tinha uma visão que atravessava esse legalismo e enxergava aquilo que Jesus ensinava acerca do perdão, e não da punição, que era a melhor maneira de lidar com o pecado para quebrar o domínio que este exercia sobre nós.
Assim, Pe. John não nega o pecado, mas ele faz parte dessa tradição contemplativa (da Escritura) que o enxerga dessa maneira. Como ilusão, não é nada, mas isso não quer dizer que não possa fazer mal. (Na obra de Shakespeare Otelo estava errado quanto à infidelidade de sua esposa, mas ele a matou por ter acreditado em uma inverdade). Pe. John também tinha forte convicção na graça curativa da confissão sacramental, como sendo uma especial maneira de se chegar ao autoconhecimento, à humildade e à abertura que nos permite experienciar o amor de Deus.
O livro A Nuvem do Não Saber afirma que o trabalho da meditação ‘resseca a raiz do pecado em nosso interior’. Isso é porque, tal como o sacramento da reconciliação e outros sacramentos, bem como outras formas de prece, ele nos abre para essa graça no nível mais profundo.
Assim, longe de ser herético, Pe. John é muito ortodoxo ao compreender o pecado dessa maneira. ‘Ainda que seus pecados sejam escarlates, eles serão brancos como a neve’. (Is 1,18) Em outras palavras, a ilusão evapora e podemos ver a luz de Deus.”
Até a Próxima Semana
Escola da Comunidade Mundial para a Meditação Cristã
BRASIL