carta 38 – Nascimento de Cristo na Alma

Temos falado nas últimas semanas sobre o fato de que a prática séria da meditação, a oração contemplativa, nos leva gradualmente ao profundo silêncio interior, onde tomamos consciência da presença de Cristo dentro de nós. Neste dia de Natal, gostaria de partilhar convosco o ensinamento de Mestre Eckhart sobre esta crescente consciência intuitiva, a que chamou o “Nascimento de Cristo na Alma”.

Meister Eckhart apoia a visão dos primeiros Padres da Igreja de que podemos “conhecer” a Deus porque temos algo essencial em comum com o Divino, que ele chama de “a faísca”, “o castelo” ou, às vezes, o “chão” de nosso ser. Ele sente que somos capazes de “descer” a este “chão” de nosso puro ser e tomar consciência de sua verdadeira natureza Divina. Assim, somos transformados em Cristo, ascendendo com Ele a Deus nesta vida. Ele chama o momento de realização de nossa potencialidade de conhecer a Deus de “o nascimento de Cristo na alma”. Ele partilha com Santo Agostinho o primado desta experiência, que disse: “De que me serve que este nascimento de Cristo esteja sempre a acontecer se não acontece em mim? Que isso aconteça em mim é o que importa.” Um sinal importante dessa potencialidade é o profundo anseio da humanidade por Deus implantado pelo Divino na “centelha” no centro do nosso ser.

Ele vê esse “nascimento” como uma revelação. Isso ocorrerá, se “mantivermos a mente fixa em Deus”. Não é resultado de nenhum esforço da nossa parte, mas um dom puro, uma graça: “Só Deus deve fazê-lo… e você deve passar por isso.” Como Orígenes e Santo Agostinho, ele fala do caminho do conhecimento intuitivo, o caminho “pelo qual Deus pode ser visto”, como “o olho do coração”. Ele fala de “conhecimento puramente espiritual; Aí a alma é arrebatada de todas as coisas corporais. Lá ouvimos sem nenhum som e vemos sem matéria…”

Nossa capacidade intuitiva de conhecer a Deus, nosso modo de poder ter contato direto com a Realidade Divina, é nossa ‘centelha’ Divina, mas ao mesmo tempo é também o elemento que nos torna verdadeiramente humanos. Ela nos dá a capacidade de ver além do mundo criado comum e de nossas próprias necessidades e desejos e olhar para os outros com compaixão e, ao mesmo tempo, apreciar verdadeiramente a criação como uma manifestação do Divino.

Mestre Eckhart não nega de forma alguma a importância de nossa inteligência racional, o que, dada sua formação educacional e carreira altamente intelectual, é muito compreensível. Embora ele sinta que Deus não pode ser alcançado pela razão, ele considera [que] nossas faculdades racionais [são] essenciais para esclarecer nossa experiência intuitiva. Ele vê a contemplação como um casamento de mente e coração. A urgência de seu ensino é ocasionada por sua convicção da necessidade de todos tomarem consciência dessa potencialidade.

Encontramos essa mesma urgência no ensinamento de John Main. Ele enfatiza constantemente que a repetição fiel e ardente de nosso mantra nos levará ao Silêncio, onde nos é dado o dom, a graça dessa profunda percepção da verdadeira natureza Divina do fundamento de nosso ser. “Nada descreve Deus tão bem quanto o silêncio.”

Kim Nataraja

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