carta 37 – Autoconhecimento e relacionamento

Vimos como o autoconhecimento e os relacionamentos verdadeiros e abertos desempenham no caminho espiritual um papel importante. “O autoconhecimento determina a qualidade de todo relacionamento (…), mostra como o dom do autoconhecimento [de Jesus] aos seus amigos foi o passo fundamental em seu relacionamento universal com a humanidade por meio do Espírito Santo, seu autoconhecimento derivado da consciência da união com seu Pai.” (Jesus, o Mestre Interior)

Nosso autoconhecimento também emerge do silêncio da oração contemplativa, quando tocamos a “mente de Cristo”. É por isso que ouvimos São Paulo dizer em Romanos: “Não vos adapteis mais ao padrão deste mundo presente, mas deixai que a vossa mente seja refeita e toda a vossa natureza assim transformada”. Os insights que se seguem vêm, portanto, quando abandonamos o domínio do ego com sua ilusão de separação e seu medo de não sobreviver. Sem os preconceitos e a atitude defensiva do ego, podemos abrir-nos ao Divino, permitindo uma relação amorosa e fiel com o Divino e uma genuína relação de confiança com os outros.

Que esse processo leve à união com o Divino está subjacente a todo o ensino da meditação: nossos pensamentos, as operações de nossa mente, nossas emoções precisam ser transcendidas, para que possamos experimentar nosso verdadeiro eu no Divino sem obstáculos. Se elas não são transcendidas, estamos apenas nos enganando e estamos apenas flutuando na “pax perniciosa” ou “paz perniciosa”, como João Cassiano chamou no século 4 d.C. Então, depois de anos de prática, ainda nos encontramos na mesma construção mental ilusória. Temos que resistir a esse desejo de nos perdermos em um mundo de sonhos.

Uma relação realmente profunda é sempre uma relação de amor. A união com o Divino é vivida como uma relação de amor. Essa é a essência da visão cristã de Deus: “Todo aquele que ama é filho de Deus e conhece a Deus, mas os que não amam nada sabem de Deus. Porque Deus é amor”. E Mestre Eckhart mostra a importância primordial disso em seu ditado: “[Em] tudo o que Deus opera, a primeira coisa que irrompe é a compaixão”. Bede Griffiths contou a linda história [sobre] como se sentiu perdido ao não morrer após [sofrer] um AVC. E então ele ouviu uma voz, dizendo ‘Entregue-se à Mãe’ e ele o fez. Então, sentiu-se imerso como num “mar de amor”. Pessoas que o visitaram posteriormente disseram que ele se tornou uma personificação do amor – o reservado cavalheiro inglês tinha desaparecido.

Quando perguntaram a John Main como deveríamos nos preparar para a meditação, ele disse que deveríamos fazê-lo por meio de pequenos atos de bondade. Laurence Freeman disse que o único parâmetro de progresso na meditação é: “Existe um aumento no amor?” aumento do amor por si mesmo e pelos outros. Como disse o Padre do Deserto Evágrio: “Se você ama a si mesmo, você ama todos os homens como a si mesmo”. Tendo encontrado Deus em nossa própria profundidade, nós o encontramos em toda parte. “Este é o objetivo da vida espiritual. Mas Evágrio admitiu que não foi um caminho fácil: “Um ancião disse: passei 20 anos lutando para ver todos como um só”. Seu conselho sobre a injunção cristã de “Amar o próximo como a si mesmo”, uma das coisas mais difíceis de adquirir verdadeiramente, foi: “Não é possível amar todos os irmãos no mesmo grau. Mas é possível associar-se a todos de uma maneira que esteja acima da paixão, isto é, livre de ressentimento e ódio.”

Kim Nataraja

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