carta 52 – Autoconhecimento versus auto-obsessão

Vimos que o autoconhecimento é o resultado de “observar os pensamentos”. Mas o uso da. autoconsciência dessa forma, com sua concentração nos “demônios” e nas artimanhas do “ego”, traz um risco embutido. É fácil que uma busca genuína pelo autoconhecimento se transforme em auto-obsessão. Ficamos tão fascinados por identificar nossas necessidades de sobrevivência “não atendidas” e a maneira como essas “feridas” levaram a “demônios” que controlam nosso comportamento, que esquecemos a verdadeira razão pela qual estamos fazendo isso, nossa busca por nosso verdadeiro eu em Cristo e a Realidade Divina a que ela nos liga. Somos então como a centopeia na seguinte história: “A centopeia era capaz de correr muito rápido. Um dia lhe perguntaram: ‘Como você pode manter todos os seus pés sob controle, nunca os cruzando, nunca tropeçando? A essa velocidade também!

E com que perna você realmente começa a correr?’ A centopeia começou a pensar e descobriu que não sabia. Ela continuou pensando, tentando descobrir, mas sem sucesso. Ela estava enraizada no local, ainda ocupada pensando ‘como?’ e incapaz de se mover!”. A autoconsciência pode se tornar a maior barreira para progredir no caminho espiritual, quando usamos essa habilidade de forma restrita: em vez de ser uma consciência de todo o eu, [nos] limitamos e focamos estritamente na parte superficial de todo o nosso ser, o “ego”, e nem mesmo todo o “ego”, mas principalmente sua parte ferida. Precisamos fazer isso inicialmente, como vimos ao discutir as várias formas de “atenção plena”. Mas a razão para fazer isso é tornar-se verdadeiramente autoconsciente, autoconsciente no melhor sentido da palavra, consciente de todo o “eu”, que inclui nosso eu superficial, o “ego”.

Transcendemos assim o “ego” e possibilitamos que ocorra a integração entre o “ego” e o resto do nosso ser. Retemos a sabedoria do “ego”, mas um “ego” que agora pode ver o quadro mais amplo – um “ego” que é parte integrante do todo, não mais separado e isolado. Ao sermos alienados de nosso próprio nível mais profundo de consciência, também somos realmente alienados dos outros, da criação como um todo e da Fonte Divina à qual estamos ligados. Ao nos tornarmos inteiros, perdemos essa sensação de isolamento e nos sentimos totalmente parte da teia interconectada da vida.

Esse verdadeiro autoconhecimento é o oposto da auto-obsessão. Não é autoconhecimento por si só, mas como forma de entrar em contato com o seu verdadeiro “eu”, permeado e sustentado pela Realidade Divina: “a realidade que chamamos Deus tem primeiro que ser descoberta no coração humano; além disso, não posso vir a conhecer a Deus se não me conhecer.” diz Mestre Eckhart, fazendo uma ligação clara entre o psicológico e o espiritual. O autoconhecimento anda de mãos dadas com a realização de todo o seu potencial – algo que todas as principais religiões e tradições de sabedoria encorajam. No cristianismo, ouvimos Jesus dizer: ‘Eu vim para que tenham vida, e para que a tenham em toda a abundância’. (João 10, 10) Como poucas pessoas realmente ouvem o profundo ensinamento de Jesus e deixam que ele transforme sua vida!

Sem o verdadeiro autoconhecimento somos prisioneiros de nossas necessidades e pulsões. Somente o autoconhecimento leva à verdadeira liberdade: podemos então responder puramente às necessidades de uma dada situação, sem expectativas egocêntricas e sem agendas ocultas. Ele nos permite usar todos os nossos recursos, incluindo nossas faculdades intuitivas e explorar o Amor Cósmico e a Sabedoria. Agiremos, então, com preocupação com as necessidades dos outros e, ao fazê-lo, também teremos nossas próprias necessidades atendidas.

Kim Nataraja

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