Carta 31 – O Reino de Deus
Cara(o) Amiga(o)
A qualidade essencial para a verdadeira meditação, a oração contemplativa, é a entrega. É uma questão de renunciar aos pensamentos, à imaginação e às imagens. Ao fazer isso, deixamos de lado o passado e o futuro, nossas memórias que já nos moldaram, e nossas esperanças, desejos e medos, que moldam nosso futuro. A meditação, com a fiel repetição de nossa palavra-oração, cria o hábito de permanecermos no momento presente, e isso influencia a vida cotidiana.
Vemos as pessoas e as situações como são e não por meio da matriz de nosso condicionamento e das necessidades de sobrevivência. Quanto mais meditamos, mais somos capazes de fazer isto e mais a ênfase de nossa atenção mudará de nossas próprias necessidades de sobrevivência para a preocupação com a sobrevivência dos outros e de nosso meio ambiente. Somos capazes de abrir mão de nossa vontade egocêntrica e de nos render verdadeiramente a que ‘Seja feita a vossa vontade’.
Também teremos mais vislumbres de outra realidade, uma realidade de paz e amor, que nos encoraja a perseverar apesar de todas as dificuldades de nossos pensamentos dominadores. Nas Escrituras, essa outra realidade é descrita por Jesus como “O Reino”. Entrar no “Reino” era o objetivo final dos Padres e Madres do Deserto, em cujo exemplo baseamos nossa forma de oração. Seu objetivo intermediário era “pureza de coração”.
Thomas Merton expressou esse estado da seguinte maneira: “O que os padres mais procuraram foi o seu próprio eu verdadeiro, em Cristo. E para fazer isso, eles tiveram que rejeitar completamente o falso eu formal, fabricado sob a compulsão social do “mundo”. O lema deles era o conselho de São Paulo: “E não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos, renovando a vossa mente, a fim de poderdes discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, agradável e perfeito.” (Romanos 12, 2)
Cada vez que abandonamos nossos pensamentos e imagens, cada vez que não seguimos um de nossos desejos egocêntricos, nós como os eremitas do deserto, nos movemos ao longo do caminho em direção ao ‘Reino’. Mas o que é ‘O Reino’? Nas Escrituras, Jesus tenta nos mostrar em muitas parábolas as múltiplas camadas do verdadeiro significado do ‘Reino’. Ele não nos dá uma resposta: é difícil expressar em palavras uma verdade sentida e vivida. Ele apenas indica esta realidade: precisamos descobri-la por nós mesmos.
Não podemos fazer disso uma busca intelectual – um doutorado no significado do Reino – mas através da experiência no silêncio da oração pura, descobrimos que todos os diferentes relatos que ele dá são facetas de um diamante – a energia que tudo permeia de amor, compaixão e perdão. Laurence Freeman descreve os efeitos do ‘Reino’ sobre nós em ‘Jesus, o Mestre Interior’: “Quando o Reino está entre nós, não há ódio, nem competitividade egoísta, nem quaisquer fontes de divisão. Quando o Reino está dentro de nós, nossa verdadeira natureza dissipou toda a ignorância sobre nós mesmos e estabeleceu harmonia e integração entre o consciente e o inconsciente. Somos então livres para agir de acordo com nossa bondade essencial: como a imagem e semelhança de Deus que somos.”
Kim Nataraja
Até a Próxima Semana
Escola da Comunidade Mundial para a Meditação Cristã
BRASIL