Carta 49 – Psicologia e Espiritualidade
Cara(o) Amiga(o)
Exploramos a importância do autoconhecimento em dois níveis. Em primeiro lugar precisamos nos tornar cientes dos ardis do ego, “purificar as portas da percepção”, tais como William Blake as chamava. Percebemos as várias imagens que temos do eu e de Deus que podem impedir nosso caminho para o Divino. Em segundo lugar precisamos nos lembrar que somos mais do que nosso eu superficial; também temos um outro mais profundo nível espiritual de nosso ser, chamado muitas vezes de “verdadeiro eu”. Frequentemente o aprendizado que leva ao entendimento do “ego ferido” é visto como “meramente psicológico”, e não como algo essencial para o caminho espiritual. Mas, é errado acreditar que essa psicologia e a espiritualidade são duas diferentes abordagens para o dilema humano, e que pouco têm a ver uma com a outra. A psicologia lida com o conhecimento acerca da psique, da alma, e o ponto mais elevado da alma é o espírito; formam um todo. “A realidade a que damos o nome de Deus deve ser descoberta primeiro no coração humano; além disso, não posso conhecer a Deus a menos que me conheça a mim mesmo”, tal como afirmou Mestre Eckhart, fazendo uma clara distinção entre o psicológico e o espiritual.
Se ignoramos o psicológico, a meditação poderá vir a ser um meio de suprimir nossos ferimentos para o bem de uma paz ilusória, que a longo prazo não funciona. Nesse caso não haverá possibilidade para um verdadeiro crescimento.
Não apenas santos e teólogos, mas os filósofos também enfatizam a importância do autoconhecimento. “Conhece-te a Ti Mesmo” era o que estava escrito à entrada do oráculo de Delfos na antiga Grécia. E, de Sócrates temos que “uma vida não analisada não vale a pena ser vivida”. O autoconhecimento anda de mãos dadas com a realização do pleno potencial de cada um: “Eu vim para que tenham vida, e para que a tenham em abundância.” (Jo 10, 10)
A transformação, a mudança, é sempre difícil e, frequentemente, dolorosa. Portanto, preferimos ignorar a ligação que existe entre o autoconhecimento e o conhecimento do Divino, mas não podemos ter um sem o outro. Assim como mestre Eckhart, Santo Agostinho enfatizava a impossibilidade disso: “O homem deve antes ser restaurado a si mesmo. Como se ele fizesse de si um degrau, para nele se apoiar e se elevar para Deus”.
O verdadeiro autoconhecimento, portanto, não é auto obsessão, na medida em que não se trata de algo para proveito próprio, mas uma via para entrar em contato com o verdadeiro eu, que é permeado e sustentado pela Realidade Divina. Sem o autoconhecimento somos prisioneiros de nossas necessidades e instintos. Não podemos nos livrar de nossos ferimentos; tudo o que precisamos fazer é nos tornarmos cientes deles, para que o Espírito possa nos ajudar a minimizar seu poder sobre nós, e nos curar. Só o autoconhecimento nos conduz à verdadeira liberdade: então, poderemos responder com pureza às demandas de uma dada situação, sem expectativas em sem interesses ocultos. Ele nos permite utilizar todos os nossos recursos, inclusive nossas faculdades intuitivas, para chegarmos ao Amor e à Sabedoria Cósmicos. Então, agiremos por conta de preocupações com as necessidades dos outros e, ao assim fazer, também supriremos as nossas necessidades.
O que facilita esse processo é o silêncio da prece profunda a que a meditação conduz. Por meio do abandono de nosso ego, e de suas imagens e pensamentos, podemos ouvir a orientação do Espírito no centro de nosso ser. Quando estruturamos nossa vida cotidiana em torno da prece, quando em nossos períodos regulares de meditação damos ouvidos em amor, isso nos permite levar uma vida de maior consideração, que conduz a uma maneira de ser com maior profundidade. Dessa maneira também nos tornamos cientes do verdadeiro significado de nossa vida, nosso destino.
por Kim Nataraja
Até a próxima semana!
Escola da Comunidade Mundial para a Meditação Cristã
BRASIL