Carta 6 – Importância das Escrituras

 Cara(o) Amiga(o)

Toda a teologia e ensinamentos de John Main sobre meditação se baseiam, não apenas na experiência, mas também nas Escrituras. Todo ensinamento dele começa e/ou termina com uma citação das Escrituras. Essa mesma ênfase na Escritura como tendo importância fundamental também é encontrada entre os primeiros cristãos. Eles ainda faziam parte de uma cultura predominantemente oral; ouviam a Escritura em vez de lê-la, e guardavam-na na memória. Isso fica claro com as palavras de Santo Antão: “Vocês ouviram as Escrituras. Isso deve tê-los ensinado o como.” Santo Antão (251-356) foi o exemplo que os Padres e Madres do Deserto mantiveram diante dos olhos, embora ele não fosse o primeiro eremita no deserto – ele mesmo visitou vários solitários no início de sua jornada. Atanásio, um bispo influente, escreveu “A Vida de Antão” em copta (357), que foi muito influente para encorajar os cristãos coptas a se mudarem para o deserto, tendo as palavras de Antão como guia. Eles guardaram – na mente e no coração – seu conselho: “Onde quer que você vá, tenha sempre Deus diante de seus olhos; o que quer que você faça, tenha diante de si o testemunho das Escrituras.” A Escritura foi seu guia de como viver sua vida. Eles se encontravam para uma reunião semanal chamada ‘sinaxia’, onde as Escrituras eram lidas em voz alta, e então repetidas por eles. As palavras das Escrituras eram consideradas sagradas e exigiam total e devotada atenção. Ouvimos que um jovem monge foi repreendido por Abba Nau, um ancião, com estas palavras: “Onde estavam seus pensamentos, quando dizíamos a ‘sinaxia’, para que a palavra do salmo lhe escapasse? Você não sabe que está na presença de Deus e falando com Deus?” Depois disso, eles voltavam para sua cela e refletiam, ruminando o que ouviram. A mesma ênfase nas Escrituras encontramos na tradição celta – que John Main herdou: “Por meio das palavras da Escritura e das espécies da criação, a luz eterna é revelada.” (João Escoto Eriúgena, século IX)

Orígenes descreve sistematicamente em sua obra mais importante “De principiis” (“Sobre os primeiros princípios”), uma forma lenta, profunda e atenta de ler as Escrituras. Ele enfatiza que existem quatro níveis de leitura das Escrituras. Ele começa indicando o primeiro nível de leitura das Escrituras: interpretar o texto literalmente, concentrando-se no significado superficial, e isso é importante por si só. Mas, ele enfatiza que precisamos ir além disso, para o ensino moral implícito. Em seguida, ele nos encoraja a ir ainda mais longe e examinar o significado alegórico dessa passagem. Nisso estava perfeitamente de acordo com São Paulo: “A nossa capacidade vem de Deus, que nos capacitou para administrar uma aliança nova: não de simples letra, mas de Espírito; porque a letra mata, o Espírito dá vida” (2Cor 3, 5-6). Isso, por sua vez, nos leva finalmente a sermos confrontados com o espírito do texto dado, um encontro com o Cristo ressuscitado, a essência da Escritura para Orígenes: “É assim que você deve entender as Escrituras – como o corpo perfeito e único da Palavra”.

Existe um excelente fundamento para essa disciplina nas Escrituras. Em Lucas, ouvimos: ‘Maria, porém conservava isso e meditava tudo em seu íntimo.’ (Lc 2, 19) A atitude de Maria é um belo exemplo de leitura com o “olho do coração”, uma leitura intuitiva. Envolvemo-nos profundamente com o texto de uma forma gentilmente atenta e reflexiva. Essa forma de se envolver com as Escrituras passou a ser conhecida desde Orígenes como a disciplina da “Lectio Divina”. Do século VI em diante, isso se tornou parte integrante da forma de oração beneditina, que John Main, como monge beneditino, endossou de coração.

Kim Nataraja

Até a Próxima Semana

Escola da Comunidade Mundial para a Meditação Cristã
BRASIL

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